H@ VIDA DEPOIS DOS 40

...com pensamento, opinião e poesia em doses homeopáticas...

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

índole amistosa

Uma índole que se incorporou ou que sempre fez parte do meu ser me arrasta a fazer as escolhas vitais. Das menores às mais relevantes. Desde o mais trivial ato de acordar e decidir levantar ou continuar na cama até a decisão de demissão ou permanência no emprego, mudança ou continuar morando na mesma cidade ou entre aceitar desaforos e chutar o balde.
Um centro decisório pessoal tem nessa minha índole - que me faz ser o que sou – o seu critério.
Entre tantos tipos humanos, há pessoas acomodadas, pessoas incomodadas e pessoas inconstantes. Vivo na tensão contínua entre acomodação e o incômodo que isso me faz sentir. Ajo, pois. Mas uma ação lenta, gradual e com vistas ao longo prazo. Inconstante não sou. Definitivamente. E não gosto de gente inconstante que ora está de um jeito ora de outro. Uma vez todo sorrisos e na outra, cara virada. Ora amistoso, ora hostil. Em gente assim nunca creio no sorriso estampado pois antecipo a ameaça velada escondida entre os dentes que tenderão a ranger avante.
Não há segurança em relacionamentos desse naipe. Fujo. O bom mesmo são as pessoas que despertam sempre ora o entusiasmo ora a solidariedade, quer sorriam quer vertam lágrimas. Entusiasmo e solidariedade sempre nos impulsionam para frente e para o alto. E só mesmo em gente acolhedora, positiva e entusiasta vale a pena investir confiança e amizade!

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

monólogo

Passei da casa dos 50... nessa aventura perdi pedaços importantes de mim, mas a vida enxertou novas vidas em minha estória. Nunca estou só - não ao menos completamente. Caminho por caminhos navegados e descortino horizontes novos os quais sempre me vejo a desbravar. É verdade que acordo muitas vezes interrompendo muitos dos melhores sonhos... mas nada que uma boa cochilada não os permita resgatar. Estou aqui e faço parte de um momento raro da humanidade - único para mim e meus contemporâneos. Quiçá me leiam no futuro - que pelo menos eu mesmo o faça. Quem sabe as minhas letras imortalizem uma parte de mim. Aquela parte que ousou expressar-se e deixar registradas impressões que o tempo costuma dissipar... De todo modo, é preciso viver. E se é bela a vida, bom é exprimir os momentos marcantes: sejam os de maior deleite bem como os de aflições, incertezas e ansiedades - sempre na certeza que a alegria deve prevalecer e suceder a cada um destes momentos de tensão que se experimenta no decorrer de uma existência...
Que a vida possa fluir livremente, em planos feitos ou acasos, - mas que amadureça e frutifique até o seu ocaso!

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

tsunamis

Após um arrastão de sentimentos confusos que por vezes nos invadem corpo, mente e alma, sobra apenas uma clareira no meio de uma densa floresta interior repleta de pigmeus. Estes serezinhos espionam descaradamente a nossa mente confusa e saem contando a todo mundo quem na realidade somos. Na verdade eles não falam - são mudos - mas dirigem holofotes reveladores sobre os nossos pontos mais sombrios. Tá certo que ninguém fala dessas coisas, fingindo que não existem dores escondidas e que homem que é homem não chora... As vezes são necessários muitos anos pra que a coragem nos ajude a retomar certos eventos e só então encará-los de frente. Aí, como se diz, as águas já rolaram e não há muito por fazer a não ser rir de tudo aquilo que, quando aconteceu, tantos males nos causou. O riso é de fato um grande remédio. Uma de suas qualidades é que nos ensina a não levar tudo tão a sério na vida. Claro que não são lições muito fáceis no momento mesmo em que nos estão sendo ministradas - no meio de lágrimas e ranger de dentes. Mas a gente cresce - não necessariamente amadurece, - e inevitavelmente ficamos mais velhos. Aí você se olha no espelho e não consegue acreditar que aquele cara ali na sua frente já passou dos cinquenta. Parece que foi ontem que tudo começou mas, na melhor das hipóteses, mais da metade já ficou para trás. O que me parece estranho é que mesmo depois dos inúmeros pequenos tremores ou dos raros grandes tsunamis da vida - ainda me sinto aquele mesmo rapazinho que já não aparece mais na minha frente quando o procuro no espelho...

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

culpa

A culpa é sorrateira. Estamos no mesmo ringue há cinquenta anos e, embora nunca tenha me levado a nocaute, também nunca me dá tréguas. Às vezes tenho motivos para defrontar-me com ela e outras vezes dá o maior trabalho tentar advinhar o porquê da nossa rinha. Nem sempre há um. Já fiz terapia, fui no centro espírita, consultei o seu vigário... nada! Quando tudo está perfeito, mesmo assim me assedia com seu riso cínico, como a dizer - "pensa que vai ficar assim é?!"... Quando piso na bola de verdade, então, ah como a dita me espezinha! Pensei que na maturidade eu a venceria, mas parece que ela se tornou mais maliciosa e arrogante - ainda mais sutil e poderosa, ao ponto de eu não conseguir derrubá-la como sempre pretendia. Tenho que admitir - é uma companheira de longa data e vai ser parceira de aturar por toda a vida...

domingo, 10 de fevereiro de 2008

caçada literária

Veio embarcado em moderno submarino mas não chegou molhado. É um elegante volume de capa alaranjada e o dorso em tons pastéis. Senti o aroma das suas páginas que são tantas quanto a soma dos dias do ano - ao menos na versão publicada pela Editora Nova Fonteira, traduzida por Maria Helena Rouanet. Gosto deste cheiro de livro novo. Apreciei demoradamente o aspecto exterior com suas cores e formato e em seguida sentei-me no sofá da sala, li como sempre faço as duas orelhas e em seguida mergulhei ludicamente naquele soberbo enredo. Li desabalado sem conseguir parar, sorvendo aquele conteúdo denso, triste, alegre, magnânimo - tudo junto - em apenas dois ou tres longos goles. Ao terminar - ainda refém das múltiplas sensações provocadas pela leitura - me deu vontade beijar com reverência aquele objeto precioso. Meu coração poeta ainda bate descompassado. Bendito Khaled Hosseini com este seu maravilhoso O Caçador de Pipas...

sábado, 9 de fevereiro de 2008

conto da esquina

Quando virei aquela esquina no caminho de todo dia jamais podia imaginar quem viria em sentido contrário. Fui pego de supresa e fiquei absolutamente sem reação. Mais de sete anos sem notícias e embora seu semblante permanecesse nítido em minha mente, já não era uma lembrança assim tão frequente e eu até pensava que não exercia mais sobre mim seu antigo fascínio. Ledo engano pois ao vê-la minhas pernas bambearam, a voz sumiu na garganta e o chão pareceu faltar-me sob os pés. Ela nem pareceu notar-me apesar de em nenhum instante desviar de mim o seu olhar ou me evitar. Nos cruzamos sem palavras e cada um continuou o seu caminho. Não me pareceu nenhum pouco perturbada e arrastando aquele garotinho de cabelos encaracolados seguiu sem me dirigir palavra. Quanto a mim, emudecido de espanto e incapaz de articular qualquer grunhido, afundei numa sombria noite de lembranças e agora, quando me supunha inteiramente livre daquela obsessão, vi subitamente me envolverem de novo aquelas teias do passado. Feito um robô meus passos me levavam sem destino. Haverá um novo encontro? De quem seria o menino? Seus vivazes olhos infantis amendoados tinham algo dos meus. Meu Deus, seria possível?! Teria sido este o motivo do súbido desaparecimento e da sonegação sistemática de explicações e notícias? Ela sabia que eu não queria ter filhos tão cedo, mas... Virei o pescoço cento e oitenta graus propenso a correr e persegui-la, mas ela já desaparecera mergulhando novamente no nada de onde surgira, depois de seus passos decididos a terem feito dobrar a nossa esquina...

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

um fado em lembranças

Ao espelho embaçado minha imagem alterada não é verdadeira. Mas eu me conheço e com fantasia elimino as deformidades e o efeito dos anos acumulados. Sobrepõe-se nova imagem recuperada na lembrança residual das décadas passadas. Um jovem se apresenta com olhos vivazes e sonhos de futuro. Me remexo inquieto e volto ao aqui e agora em que o futuro já chegou. Percebo que foram feitos muitos ajustes na longa travessia. O ponto alcançado não é aquele sonhado mas também não é tão frustrante assim pois o caminho sinuoso foi bom e permitiu - ao lado de inúmeros percalços - algumas nuances de aventura. Venturas e sabores neste universo múltipo que carrego nas minhas mais profundas instâncias e reminiscências. Palavras fazem parte da bagagem e foram entalhadas com cuidado no decorrer da jornada contínua que ainda me permite sonhar... Aonde está o porto, pra onde me leva este mar?! É preciso ir além, é preciso navegar!

sábado, 2 de fevereiro de 2008

frutos maduros



sorvo um trago gelado
e abraço a imensidão infinita
ao meu redor crianças em burburinho
não me incomoda o alarido
aprecio a bruma e a vastidão do mar
descalço mergulho os pés na areia
um torpor me invade a alma
descanso absorto e calmo
tuas mãos desalinham meus cabelos
não peço quase nada
me bastam tais momentos
e a certeza do teu amor maduro
se estás ao meu lado
nestas tardes quentes
assim indolente
é tudo o que preciso
para viver feliz...

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

feriado

Começa o Carnaval. Para mim isso não quer dizer absolutamente nada. A sua vantagem relativa é ser um feriado prolongado. Mas o que é mesmo que se celebra? A farra, as orgias, a bebedeira e um monte de gente morrendo estupidamente nas estradas - alguns vítimas de seus próprios excessos, outros vítimas do excesso alheio, o que - convenhamos - é o pior. As estatísticas depõem contra o carnaval. É um tal liberou geral, um vale tudo que permite a extrapolação do que há de mais perverso no ser dito humano. Se eu for pro litoral vai ser preciso muita paciência e estratégia para fugir do trânsito e torcer para que a infraestrutura local suporte a multidão que desce a serra. Costuma faltar água, ter filas quilométricas nas padarias e nos mercados. E, além de tudo, a meteorologia informa que pode chover a partir da segunda. Chuva e praia são como água e óleo, não se misturam... Como diz a garotada, "não rola".
Mas para mim, na hipótese de chuva, até vou conseguir dormir mais sossegado porque a turba molhada faz menos barulho...
Feliz feriado!